sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Festival de besteiras



Desta vez, não teve pra ninguém. Gilberto, o Alcaide, saiu na disparada e bateu o ranking de besteiras ditas por um político durante uma tragédia. (Ok, Lula extrapolou com a merda no discurso, mas não havia uma tragédia em andamento). Gilberto alistou-se, assim, no clube que reúne gente mais tarimbada na política, como o falecido Franco Montoro e a resistente Marta Suplicy.





Pra quem esteve em Marte na semana passada, eu explico: de segunda pra terça-feira, o céu desabou sobre São Paulo. Choveu gato, cachorro, periquito, cacatua, rinoceronte, iguana e ferret - em suma, choveu até dizer chega. Dois dias depois, a TV mostrava alguns bairros que teimavam em permanecer alagados.





E o que disse Gilberto a respeito desse dia tão caótico, mas tão, que a cidade registrou índice zero de congestionamento - simplesmente porque as pessoas não conseguiam se locomover a partir de certos pontos. "Está tudo sob controle", disse o Alcaide, revelando uma face budista desconhecida até de quem votou nele por convicção. Em seguida, Gilberto contestou os pessimistas e afirmou que a coisa não estava tão feia. O grande debate que surgiu a partir daí foi tentar entender o que o alcaide da maior cidade do país define por "caos".



Falar cretinices é um esporte muito praticado entre os políticos. Revela, além da pobreza de raciocínio, um tremendo desprezo pelo bem estar público. Exagero meu? Não. Quando Franco Montoro percorreu as áreas da cidade cobertas até o teto por água de enchente, em vez de lamentar a desgraça dos atingidos, suspirou: "Lembra Veneza". Foi muito gratificante para as vítimas da enchente saber que sua vida chegara, enfim, a níveis europeus.



Também Marta Suplicy perdeu uma luminosa oportunidade de se fingir de surda, quando questionada sobre o caos aéreo que transformava qualquer vôo numa gincana de Rollerball. À época ministra do Turismo, Marta disse que os prejudicados pelos atrasos monumentais deviam "relaxar e gozar". Trata-se de uma frasezinha que todo mundo usa de vez em quando. Na boca de uma ministra, chamada às falas sobre um problema seríssimo de sua pasta, a frase levava o maior jeito de chacota.

Recentemente, ao anunciar o plano de obras que interdita total ou parcialmente cinco pontes sobre o Rio Tietê, o governador e o prefeito estavam tranquilos: as obras não prejudicariam o trânsito de São Paulo. Limitados pela realidade concreta dos fatos, alguns repórteres insistiram e, ao Estadão, o governador deu a solução mágica: "Basta o cidadão negociar novos horários de trabalho com suas chefias". Deve fazer muito tempo que o governador não pega no pesado de verdade, das 8 às 18 com uma hora de almoço. Desconfio até que nunca tenha passado pela experiência de carregar uma marmita.

Não ter sofrido não significa que o sujeito seja um monstro insensível. Ele pode ter tido berço de ouro e compreender o quanto é ruim, por exemplo, usar o transporte público nessa cidade. Qualquer guaxinim que tenha frequentado a escola - mesmo que levado de carro particular por pápi e mami - conseguiria entender que os novos ônibus de São Paulo, cheios de degraus, são um convite ao braço quebrado. Mas, o que faz a prefeitura? Aceita esse veículo e obriga a população a fazer verdadeiros malabarismos diariamente nas ruas da cidade.

Da mesma maneira, na gestão de Erundina (de quem gosto muito), um elogiado programador visual, querido em tudo quanto é bar bacana da Vila Madalena, determinou que todos os ônibus de São Paulo tivessem as mesmas cores. O Iluminado esqueceu que uma grande maioria da população tem pouquíssima intimidade com a língua escrita - maneira tucana de dizer que são analfabetos - e o que se via nos pontos era um amontoado de gente desesperada atrás de seu ônibus, já que não conseguia ler os letreiros...

Estou fugindo do tema? Acho que não. Tudo gira em torno do mesmo ponto: o solene desprezo pelo bem coletivo, pelo interesse da população. É como se prefeitos, governadores, ministros e os que os assessoram trabalhassem não pela cidade em geral - mas contra seus não-eleitores. Eles não governam: vingam-se dos votos não recebidos. O pior é que, na hora de votar, a marujada vai lá e reelege essas figuras. Francamente, nem sei porque eu esquento a moringa.

p.s. Divertidíssimo imaginar a cara de Gilberto, o Alcaide, ao ver que os vereadores rejeitaram seu pedido de aumento salarial. Atire a primeira pedra quem nunca pediu aumento e o chefe disse 'não'...

p.s.2 Como vocês devem ter desconfiado, se chegaram até aqui, eu não estou no time dos colegas artistas que derramam-se em elogios às administrações, presentes e passadas, só porque visitaram um dos nossos no hospital. Luz na praça, que é bom... policiamento, que é fundamental... necas...

18 comentários:

  1. Só faltou incluir no rol de frases lapidares dos políticos o "estupra mas não mata" de Maluf.
    Parabéns pelo texto e pelo blog.
    abs

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  2. Mas isso é hors concours, né, Paulo? Um verdadeiro clássico. E tem gente que ainda segue o sujeito.

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  3. Lavou-me a alma. Gilberto, o Alcaide, passou a juventude no clube Pinheiros, só precisava atravessar a rua pra chegar lá. Muita gente critica a Marta, claro que ela pisou na bola, é nervosinha, mas eu jamais esquecerei que ela implantou o Bilhete Único, tão anunciado pelo finado Mario Covas e pelos tucanos bons de bico por mais de década - e nada!. Só Martinha foi lá e fez, guerreando com a máfia dos perueiros e vencendo. É uma conquista que ninguém mais tira da gente. Até com bolsa Louis Vitton na enchente eu prefiro a Marta. E a Erundina também. Valeu, menino. Há vida inteligente fora das redações da Folha, da Veja (e seus blogs) e da Globo.

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  4. ele tb disse q esse ano foi muito melhor, q eles estavam satisfeitos. como alguém faz uma entrevista coletiva em um caos daquele e fala tanta bobagem? depois disse q a verba da limpeza aumentou e muito. mas ninguém perguntou se ia pra limpeza ou pro arruda. e ainda arrematou q quem fosse multado de manhã pelo rodízio não ia receber a multa. mas q o rodízio continuava à tarde, com se tudo já estivesse normalizado e ningúem estivesse preso em enchentes ainda. ele queria a todo custo garantir o dinheiro do faturamento do rodízio e não estava nem um pouco consternado com as mortes nos deslizamentos, não deu os sentimentos as famílias. enfim... vergonhoso. beijos, pedrita

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  5. Não há o que dizer diante de uma catástrofe climática, qualquer coisa que se diga, depõe contra o governante.
    Não acho que Kassab se saiu tão mal assim, mas acho inquestionável que a imprensa foi muito mais condescendente com ele do que foi no tratamento dado a Erundina e Marta.
    Esta sim é questão política relevante.
    Mas se Demos e tucanos têm tolerância e por vezes apoio da mída, falta-lhes mesmo é sorte.
    Arruda com enchente foi uma combinação terrivel, para uma oposição cada vez mais acuada, venal, que tenta sobreviver no cenário político de apoio de 83% da população ao presidente Lula.

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  6. Ai... preguiça. Vou me abster de comentar sobre as duas figuras da atual gestão de SP. Fico com as palavras ouvidas de um porteiro, ao chegar atrasado na terça pela manhã. – Quase não chego, a cidade tá um CASO.

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  7. KKKKKKKKKKK... Adorei, Heitor. Seu porteiro é um poeta concreto!

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  8. Neurolinguística é tudo, Mário. Parece que todos os administradores fizeram curso com Lair Ribeiro (lembra dele?). Ou então que são hindus: a realidade é uma ilusão. Antes da eleição a realidade é plataforma, depois, puf, desaparece.

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  9. Pois é, Dedé. Dizem que povo não tem memória. Desmemoriado é político, que abstrai de tudo o que prometeu assim que recebe o resultado soberano das urnas...

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  10. Qto ao "p.s. 2": muito me irrita a infantilidade de grande parte da classe artística. Ok, Arte é lúdica e o artista prescisa alimentar a criança interior e blá, blá, blá. Mas achar bacana político fazer visita em hospital beira a burrice! Esses negos só vão a hospital atrás de voto. Ou a moçada esqueceu que estamos em campanha? Tem mais é que ficar em cima da liberação da tal verba do BID, isso sim! Ô desânimo...

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  11. Vianinha...
    No PS2 vc esqueceu de mencionar aqueles que anunciam que o Governador é frequentador de teatro...e da Praça Roosenvelt...

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  12. Gostaria de corrigir o "prescisa" do meu comentário anterior!!! Quase desmaiei qdo reli, mas Inês é Marta agora! hehehe Eu sei que me excedi no "s". Ou seria no "c"? Brincadeirinha...

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  13. Aninha, quem te conhece sabe que seu português é sempre correto. Escorrega de vez em quando, mas é como eu sempre digo... Até eu erro.

    Leozinho, vc quer me fritar... rs rs... O incontestável é que o governador realmente frequenta aquelas calçadas. Nem sempre à procura de uma boa peça, mas que vai, vai.

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  14. Ana

    Escrever em blog de, e que tem muitos jornalistas, dá nisso, a gente erra e depois quer morrer, porque sabe que o povo repara.
    Sou favorável ao perdão antecipado de todos os erros de português e de revisão, claramente involuntários, que por ventura possam vir a ser cometidos nesse blog. Ficam revogadas todas as disposições em contrário.

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  15. Acertar é nunca ter que pedir perdão... (entra o tema de Love Story)

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  16. Se isso é jeito de tratar as visitas (entra o tema de Advinhe quem vem para jantar)

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  17. Falando dessas visitas de político, só tenho uma dúvida cruel - o Bortolotto mandou ou não mandou o Serra tomar no cu quando ele foi no hospital?

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