segunda-feira, 23 de novembro de 2009
As mortes de Celso Pitta
A segunda morte do ex-prefeito Celso Pitta, noticiada no sábado, pegou muita gente de surpresa. Poucos sabiam que ele estava doente e a maioria já dava o homem por morto desde que ele saiu da prefeitura e só se meteu em confusão - seja com a ex-mulher, seja com a Polícia Federal.
A terceira morte de Celso Pitta ocorreu algumas horas depois do seu falecimento físico. Ao velório e ao enterro, realizados debaixo de uma chuva que os jornais de antigamente classificariam de torrencial, compareceram umas 100 pessoas - no enterro, mesmo, eram umas 30 almas pingadas, contando a mãe de 89 anos e os filhos, que chegaram poucos minutos antes do caixão baixar à sepultura.
No domingo, os jornais publicavam a notícia embaraçosa e forçavam a repercussão junto a outros prefeitos paulistanos. Gilberto, o Alcaide, soltou uma nota padrão, só não totalmente formal porque remetia à morte do próprio pai, ocorrida há algum tempo. Marta Suplicy, convenhamos, deve ter discussões mais acaloradas com seu cabeleireiro sobre cor de tintura do que ditando a sua opinião sobre a morte de Pitta. Maluf, em viagem, mandou um telegrama.
Não houve surpresa nessa melancólica saída de cena. Pitta nunca teve uma tradição política: chegou à prefeitura guindado pelo padrinho Maluf, com quem se desentenderia depois. Não criou vínculos com a cidade. E nem com os mais próximos: contam as comadres que sua relação com os filhos era, no mínimo, muito complicada. Com Nicéia, nem se fala. Pra mim, a surpresa mesmo veio da reação de algumas ONGs de movimentos negros , que atribuíram o baixo ibope do enterro ao preconceito racial.
Eles dizem que Pitta foi vitimado pelo preconceito durante toda sua administração. Eu cochilei e perdi algum pedaço do filme? Até onde minha loirice consegue compreender, Pitta entrou pra história como titular de uma prefeitura corrupta, corroída pela roubalheira de precatórios e verbas desviadas. Não foi o único a ser acusado, é verdade, mas pelo jeito foi um dos que deixou rastro. Havia, sim, piadas racistas em torno de seu nome - mas não creio que este tenha sido o único combustível das críticas: o que pegava mesmo era a corrupção desenfreada.
Não foi só isso. Celso Pitta, até onde eu saiba, não deixou marcas na cidade. Era desprovido de carisma. Até a arrogante Marta Suplicy ("Ela parece uma eterna aluna de vestido rendado do Des Oiseaux", dizia uma colega do Estadão) tem seu fã-clube. Há quem vá com a cara de Gilberto, o Alcaide, e até o governador asperge seu charme sobre alguns corações femininos. Pitta - repito, até onde eu saiba - não deixou muitas lembranças.
Ele foi humilhado ao ser preso de pijama em rede nacional, da mesma forma que Marta foi achincalhada quando um estudante da São Francisco atirou-lhe uma galinha em cima (e só faltou ser ovacionado pela imprensa tucana) e Luísa Erundina era ridicularizada por ser solteira, não ter corpinho de miss e falar com sotaque nordestino.
Confundir isso com racismo, sei não. Será que é mesmo motivo de orgulho saber que um negro chegou ao poder construindo uma imagem de político corrupto? Minimizar essas acusações seria a solução ideal? Um negro corrupto é menos corrupto que um branco? Será que até pra isso vai ter cota?
O que todos esses políticos - sejamos pró ou contra - experimentaram em comum foi a campanha da maioria que se julga branca, rica, hétero e ariana. É contra isso que devemos lutar - mas sem jogar para debaixo do tapete os erros de nossos candidatos. O erro dos 'nossos' não é menos grave que o erro 'dos outros'.
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Espero, do fundo do coração, que esse senhor não tenha tantas mortes quantas teve o Quincas Berro D´água. Uma vida, para criaturas como o falecidíssimo Pitta, já é até demais. Foi tardíssimo.
ResponderExcluirAté o secretário do planejamento do Pitta se deu melhor! Hoje o tal sujeito pensa que administra SP. Vamos esperar pelas contas do TCU. Agora voltando ao falecido... Eu sempre achei que ele era um laranjão!
ResponderExcluirJoão,
ResponderExcluirBem sacado o lance do Quincas Berro d'Água que morreu ao tomar um copo de água pensando que era cachaça. Esse livro é maravilhoso.
Pra ser sincero Mário, me deu uma certa pena de ver um ser humano como o finado finar sem pompa, sem choro nem vela.
Por favor, se um dia eu me for (como dizia o colega Roberto Marinho), por favor vertam algumas lágrimas por essa pobre alma.... Depois podem dar uma festa!!! Eu deixo os CDs separados....
Ah, ia me esquecendo, não tem nenhum lance de racismo na história, até porque ele nunca fez questão de comentar sua cor. O que eu até acho correto. Nós somos o que somos por dentro (coração, pâncreas, intestinos) e não por fora...
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPalamor, gente, claro que o fato de Pitta ser negro interfere no julgamento dele pela sociedade. Como não interferiria?
ResponderExcluirNão que ele fosse inocente, que não era mesmo, mas a dureza é muito maior do que se ele fosse branquinho, ou quase, igual ao Maluf, o ACM e tantos outros. Se pudessem, teriam dado umas boas boas chibatadas, quando ele caiu derrotado, penaa que escravidão acabou, pensaram, com certeza.
Tratá-lo com um traste, um negro fujão, é por último negar-lhe homenagem é também vingar-se por ele ter se metido a prefeito de São Paulo, apesar da sua origem. Um prefeito negro, mesmo que apoiado pelo representante mor da elite branca, doeu em muita gente.
Com dói a Taís Araujo, de Helena. Vocês não têm noção dos comentários que ouço na piscina do meu prédio sobre essa "negrinha" de protagonista na novela.
Racistas paulistanos encaram o fracasso de Pitta como uma derrota da raça, quando na verdade o que ele não tinha era talento nenhum para a política, ao contrário de seu padrinho, que sabia fazer a partilha da cidade, em todos os sentidos.
A sua morte para quem odeia negros, e os há, às pencas enterra também a história indesejável do primeiro prefeito negro da cidade. Alguém duvida?
Ester,
ResponderExcluirA mesma festa que fiz pela morte de Pitta farei pela do Maluf. Ou do Collor. De predadores o planeta já está cheio. Além do mais, prefiro privilegiar os (ditos) irracionais.
Ester, é claro que havia componentes racistas nas críticas ao Pitta por parte da elite que eu cito no meu post. Mas o cerne da coisa, pra mim, é que ele foi um péssimo prefeito.
ResponderExcluirQuanto as pessoas criticarem a Taís Araújo, tem muita maldade nisso. A coitada tá fazendo o possível, mas vê se alguém tá criticando a Camila Pitanga. Não estão, pq a novela é bem melhor.
Criticaram o Marcio Garcia também, arrasaram a Gabriela Duarte. E nenhum dos dois é escurinho. Pretos, gays, japas e anões podem ser criticados. O problema é que quando 'definem' o criticado - aquela neguinha, a bicha ou o japorongo - ganha conotação racista. Eu me pergunto: será que sempre é?
Não creio que é porque a novela seja ruim que role preconceito com a Taís. A Camila Pitanga é quase branca aos olhos brasileiros, ela não, é muito mais negra, no nariz, no formato do rosto e até na postura. Ela afronta mais com sua negritudea, por exemplo por sendo bela e escolher um negro para se casar a não um branco rico.
ResponderExcluirO preconceito está em que, por ser negro, bicha ou anão a pessoa não possa ser corrupta, honesta, desonesta, boa, má, qualquer coisa própria do ser humano. Só aos brancos é permitido tudo o que há de humanidade.
E chamar alguem de negrinha, de bicha ou de japorango, de uma forma agressiva e pejorativa, ofensivamente revela preconceito, sim.
Ah, Ester, um "neguinha/o", dita com malemolência e na hora certa, tem o seu valor.
ResponderExcluirCara, a Taís tá protagonizando a novela das 8, o posto mais cobiçado da tv brasileira, e qualquer pessoa que não seja a Pollyana saberia que a menina ia enfrentar uma saraivada de críticas. A falta de trama da novela ajuda bastante, mas a inveja alheia corrói mais.
Não dá pra esperar uma aceitação imediata e complacente. A luta é dura, árdua, incansável sempre.
Mas não é por isso que devemos ceder ao pleonasmos americanistas de afro-descendente, gente pequena e flex power (pros bissexuais). Daqui a pouco vão me chamar de sertano-descendente e eu vou ficar muito puto. Sou paulistano filho de pernambucanos, tipo a música do Chico.
Tem um samba maravilhoso do Vinicius, acho que é o Samba da Benção (parceria com o Baden), em que na parte "declamada" ele (Vinicius) se autointitula branco de alma negra. Sempre gostei desse trecho, inclusive porque declaradamente é o anti-negro-de-alma-branca que era tão comum de ser ouvido quando a gente era criança (talvez até hoje ainda se fale).
ResponderExcluirE por falar em Thais Araújo, ela é uma moça formosa que não tem mais cor. As pessoas olham para ela apenas deslumbradas com sua beleza (ou invejosas).Gosto muito de ver nas ruas as moças e os rapazes negros que destacam seus traços e sua cor com penteados que valorizam o cabelo "ruim".
Mario,
ResponderExcluirMe chamo Luiz Ferando e sou ator e produtor cultural aqui em santos-sp.Temos uma cia chamada a Confraria Cia Teatral e dentre outras coisas eu tambem produzo o Festival de Teatro da cidade.
Quero muito montar seu texto Carro de Paulista em 2010. Sei que e um texto que esta sempre em cartaz e por isso gostaria de saber a viabilidade disso.
Nao sei onde encontra-lo e gostaria de conversar a respeito. se possivel me escreva
meu email e o superbacanaproducoes@uol.com.br
aguardo um contato
Luiz Fernando
Putz! Vou ter que descer a serra! MV, vc sabe que não perco uma montagem do Carro...
ResponderExcluirCelso Pitta é provavelmente o único Prefeito da história de São Paulo que não contou sequer com a deferência burocrática, de praxe, do luto oficial. Morreu como se nunca tivesse existido oficialmente. Houve um tempo em que o Collor também vivia uma proscrição semelhante (foi o único ex-presidente não convidado para a comitiva que foi ao funeral de João Paulo II, em 2005) - teve a sorte de ser reabilitado pelo voto, pela camaradagem do Senado e pela simpatia do nosso Presidente pelos renegados da política (Renan, Severino, etc). O Pitta é o "Mediano" da peça do Otávio Martins-Pâmio que não deu certo. Flavio G.
ResponderExcluirOi gente - atrasadamente, porque estava em Brasília, vou dar meu pitaco: o Pitta só não foi o pior prefeito da história desta cidade, porque este posto é do Maluf, sem que isto signifique, é claro, qualquer preconceito antissírio da minha parte. O cara tem sido um dos maiores ladrões da história deste País e olha que nasceu nele o Adhemar de Barros...
ResponderExcluirO Kassab está se esforçando bastante para chegar lá, com sua sede de fechar creches e aumentar o IPTU... Quando ele morrer, como no caso do Maluf, vou me juntar ao João (e outros) e farei um festão. E espero que ninguém ache que sou antigay por causa disso.
Racismo contra o Pitta, como contra a Taís, sempre alguns cretinos racistas terão. Mas não vamos nos viciar demais nesse politicamente correto que prefere não dar o nome às coisas...
bjs
Na boa, Mário? Só consigo pensar numa frase lendo o teu post (Muito bom, velhão!)Esta: um a menos! Hoje eu tô educado. Grande abraço, Jarbas.
ResponderExcluirÉ, gente, demorou mas o post vingou... rs rs...
ResponderExcluirJarbas, do alto do humanismo que marca minha cativante personalidade, eu pensei a mesma coisa... rs rs rs...