domingo, 30 de maio de 2010

Édipos do avesso



O que acontece com os pais atualmente? Eu sempre acreditei que pai fosse não somente o gerador do filho, mas o que cuida, o que zela e protege. Por isso, tantos homens tremiam na hora de ser pais - como assumir tamanha responsabilidade de criar e orientar um ser que dependerá do adulto para tudo, pelo menos nos primeiros anos de vida...? Começo a achar que essa linha de raciocínio - ou esse temor, como queiram - anda completamente fora de moda. Caducou. Tá out.





Primeiro, o casal Nardoni. Tem como conceber a imagem de um pai pendurando a própria filha pela janela e deixando-a cair do alto do prédio? Radical, eu não conseguiria fazer uma coisa dessas com nenhum ser vivo, imagine se fosse... Impensável. O sujeito tem de estar fora do esquadro, desalinhado da vida, perdido no tempo e no espaço de si mesmo.





Depois, fiquei sabendo de um caso em Recife, ocorrido há 21 anos. O marido matou a ex-mulher a tiros e ainda atirou nos dois filhos (na época, com 5 e 2 anos). A menina foi atingida no ombro e o garoto na cabeça - parece que ele perdeu os movimentos de um dos lados do corpo (tem uma entrevista com a garota na Folha de hoje).

Duas décadas depois, o assassino confesso ainda não foi julgado, pois a defesa sempre consegue adiar com alguma maracutaia jurídica. E o pai do criminoso, que é um velho advogado criminalista, já declarou que o filho fez muito bem em matar a mulher porque ela o traía. "Se não matasse, não comia na minha mesa", disse o avô das crianças órfãs e feridas. Dá pra imaginar que tipo de criação um biscuit desses deu ao filho.



Semana passada, em Porto Alegre, um pai esfaqueou a filha, de 3 meses, alegando... Nem sei o que ele alegou. Você não tem o que alegar quando esfaqueia um bebê. Legítima defesa? A menina morreu dias depois e os jornais pararam de noticiar a história.

E este fim de semana, as manchetes ficaram por conta do cara de Mato Grosso que contratou pistoleiros pra darem cabo do filho, por causa de um prêmio da mega sena. O pai e um outro filho teriam tramado tudo, pra ficar com os 28 milhões que o rapaz ganhou e que estão depositados na conta do pai. A notícia completa é ainda mais louca: o filho em questão está sendo julgado por homicídio. Durante um bingo beneficente, ele se confundiu ao cantar um número e se ofendeu com os comentários de um sujeito na plateia. Sacou o revólver, começou a atirar, não matou o ofensor, mas acertou um outro coitado na cabeça. Quer dizer, nesse caso pai e filhos quase que se merecem. Ou pelo menos explicam a existência um do outro.

De todo modo, são histórias que me deixam perplexo. A violência por si já é espantosa e inexplicável. Mas quando se volta para alguém do nosso sangue assume proporções de tragédia. Muito antes de ameaçar a frágil economia europeia, os gregos acertavam a mão escrevendo histórias que até hoje nos comovem. Édipo, que matou o pai e dormiu com a mãe. Medeia que, traída pelo companheiro, matou os dois filhos para se vingar. Prometeu, que roubou o fogo dos deuses para dá-lo aos homens. Mitos que continuam se reproduzindo nos noticiários do mundo inteiro, com uma violência cada vez maior e mais injustificável. E agora, sem a grandeza salvadora da poesia.

15 comentários:

  1. Eu acho que o bebê de três meses provocou o pai, criança nessa idade é muito traiçoeira.
    E matar só a parceita, desde a Malu Mulher, está fora de moda, o negocio é dar cabo logo da familia inteira. Culpa das feministas e da Regina duarte, por essa e outras que eu tenho medo dela.
    E por milhões, mata-se marido alejaido e porque não filhô? É uma boa grana, poxa vida.,
    E o pai da Izabella não teve culpa, a mina morreu ele não tinha como esconder o corpo, melhor jogar pela janela e inventar um historia. A garota não tinha nada que morrer, só porque quebrou o osso da bacia de tanta porrada.
    Mundo cão,né Mario, o ser humano é uma merda.

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  2. acho q é pq hj noticiam esses casos e hj em dia as pessoas denunciam maus tratos. pais insanos e violentos sempre existiram. antigamente então, qd bater era necessário pra educar, abusos eram enormes, só q todo mundo silenciava pq ninguém se metia na casa do vizinho. por sorte hj as pessoas denunciam. e hj em dia há mais disseminação das drogas e o horror do crack, aí tudo fica mais desestruturado tb.

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  3. MV, a nossa infância foi um mar de rosas!! Qdo eu fazia algo errado, meu pai lançava um olhar duríssimo, que gelava minha alma. E eu tinha certeza de que até o John Wayne teria medo daquele Mário. Minha mãe era + prática, pegava logo uma varinha de marmelo e tchãs na perna. Doia, mas não me deixou com nenhum trauma maior... Sofro mais hoje com estas notícias do que com os castigos de antigamente.

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  4. Ana
    Eu teria dispensadoo olhar aterrorizante do meu pai, que devia ser bem aprecido com o seu e mais ainda, a varinha da minha mãe. Amendrontavam e humilhavam só isso.
    Não é preciso de nada disso para educar os filhos. Os meus nunca tiveram medo do olhar do pai nem levaram varadas da mãe e são ótimos.
    Nos somos legais por outras coisas boas dos nossos pais, essas que você citou eu passava bem sem.

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  5. Hummm... essa lista é tão longa, né, Mário?...
    Isso sem falar nos pequenos assassinatos diários, humilhações, sabotagens, envenenamentos morais e psicológicos, manipulações, descasos, abandonos a que tantos pais submetem seus filhos...

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  6. Olha só, Ester... Não sou mãe, então entrarei em seara alheia, masss... Não concordo com vc. Limites sempre são necessários, independentes de como nos são passados. O olhar gélido e a varinha me amedrontavam sim, mas não foram a razão maior para que eu fizesse terapia anos mais tarde. Pode acreditar. Psicotapa também é cultura! rs

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  7. oba, troca de ideias!

    Realmente, a maior divulgação desses casos dá a impressão que eles não aconteciam antes. É a mesma coisa com corrupção e abuso policial. Mas que choca, choca.

    Eu também sou partidário dos limites. Não sou fã de violência física, mas reconheço que a garotada, em certa fase da vida, entende apenas uma linguagem mais física que falada. Não precisa dar tapa, soco, espancar. Mas impor um limite com apoio físico é fundamental: afinal, adulto é mais forte que criança. Pelo menos, até hoje eu tenho respeito pelo fio de ferro (e não me lembro de ter apanhado, mas havia a presença dele ali). Se traumatizou, não lembro. Só sei que nunca levei o tema à terapia. Não por timidez, mas por nem lembrar dele.

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  8. Entre tantas bizarrices, aposto também na incoerência absurda do cara de Recife, que ele não chifrava a mulher. Depois, além do crime em si, carrega essa hipocrisia machista.

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  9. E ele está casado, com 2 filhos! Digam, meninas, vcs dormiriam tranquilas ao lado de um homem q matou a mulher e tentou acabar com os 2 filhos mais velhos? Eu sei que perdoar é divino, coisa e tal, mas sei lá...

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  10. Mário e Ana

    Quem precisa de limite é adulto,criança precisa de ser tratada com respeito, mas sem que os pais abram mão do papel que lhes cabe de educar. Odeio esse dicurso do "limite". Acho perigoso para caramba.
    Bater nos filhos já foi muito normal, na lei, os pais podiam até matar os filhos que não acontecia nada, isso em tempos recentes.
    Os direitos das crianças são novidade no codigo penal brasileiro, O estatuto da criança e do adolescente é dos anos noventa.
    Por isso quando a gente fala em limite e punição fisica é preciso tomar cuidado para não compactuar com a ideologia que incentivava a palmatória e outras punicções que já foram consideradas absoluitamente normais em outros momentos da história.
    Eu não fui para o psicanalista por causa do olhar do meu pai, mas que tive uma dificuldade damada para lidar com autoidade mais tarde há isso tive. Com a minha mãe ela só perdeu pontos comigo quando pegou a varinha, achei aquilo tão ridiculo, me lembro como se fosse hoje.
    Não falo como mãe, mas como ser humano que quer que o mundo caminhe para menos violência e opressão, principalmente contra os mais fracos.
    Reitero que criança não precisa levar varada nem ficar petrificada com um olhar do pai, mesmo que isso não represente mais adiante muitas horas no divã do psicanalista.
    Trabalhei muuto com esse assunto no Projeto Travessia, aprendi um pouco, hoje quando me preocupo com o retrocesso,com o reacionarismo, me preocupo por esse lado também.
    Acho que Joyce, no "O retrato do artista quando jovm" e também o Kafka e sua "Carta ao pai", me apoaim lá do céu.

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  11. Ester, fala-se em autoridade paterna como um sinônimo de terror, o que nem sempre é o caso. É claro que eu sou contra bater em criança, creio mesmo que falei isso já. Então, repetindo: eu não gosto que batam em criança. Mas a noção, o conceito de limite é um dos apoios que a gente tem pra evoluir e passar da infância à vida adulta. Saber que o nosso direito tem como limite o direito do outro, saber ouvir um não, saber questionar esse não, saber argumentar, tudo isso advém do conceito de limite que os pais vão nos impondo. E 'imposição' não precisa ter o peso que vc está atribuindo.
    Vc esperneia, discute, chama pra briga, mas sabe do que eu tô falando. Seus filhos - e agora a sua filha, que estou conhecendo mais - são o melhor exemplo de quem teve noção de limite.
    Deixar a criança ao deus-dará de sua vontade é mais venenoso que impor castigos e lançar um olhar severo.

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  12. Completando a ideia, Ester. Seus filhos têm noção do limite sem perder a própria opinião e personalidade. Ponto pra vc no livrinho de São Pedro.

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  13. Este comentário foi removido pelo autor.

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  14. Eu acho esse papo de "limite" careta demais, ninguem me convence.
    É facil educar filho é olhar pro camaradinha e pensar: somos eu e você perdidos nesse mundo, eu não sei nada você tb não, mas quem decide aqui sou eu por tenho a responsabildiade de te educar.
    Simples assim, exigir e ser presente, o que a maioria dos pais não é.
    Por isso que sou a favor de limitar os pais, que dão pouco beijo e abraço e muita disciplina ou muito pouco caso, o que dá na mesma.

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  15. Mas, Ester, se você ensina pro seu filho: "Não pega esse brinquedo, pq ele é do seu colega" ou "Para de bater na sua irmã", isso é limite, gente. É ensinar que o cara não pode fazer o que der na veneta. Quer dizer, poder, pode. Mas tem de saber que a coisa tem consequência. Limite também é isso. Não é só castração.

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