
O que acontece com os pais atualmente? Eu sempre acreditei que pai fosse não somente o gerador do filho, mas o que cuida, o que zela e protege. Por isso, tantos homens tremiam na hora de ser pais - como assumir tamanha responsabilidade de criar e orientar um ser que dependerá do adulto para tudo, pelo menos nos primeiros anos de vida...? Começo a achar que essa linha de raciocínio - ou esse temor, como queiram - anda completamente fora de moda. Caducou. Tá out.
Primeiro, o casal Nardoni. Tem como conceber a imagem de um pai pendurando a própria filha pela janela e deixando-a cair do alto do prédio? Radical, eu não conseguiria fazer uma coisa dessas com nenhum ser vivo, imagine se fosse... Impensável. O sujeito tem de estar fora do esquadro, desalinhado da vida, perdido no tempo e no espaço de si mesmo.
Depois, fiquei sabendo de um caso em Recife, ocorrido há 21 anos. O marido matou a ex-mulher a tiros e ainda atirou nos dois filhos (na época, com 5 e 2 anos). A menina foi atingida no ombro e o garoto na cabeça - parece que ele perdeu os movimentos de um dos lados do corpo (tem uma entrevista com a garota na Folha de hoje).
Duas décadas depois, o assassino confesso ainda não foi julgado, pois a defesa sempre consegue adiar com alguma maracutaia jurídica. E o pai do criminoso, que é um velho advogado criminalista, já declarou que o filho fez muito bem em matar a mulher porque ela o traía. "Se não matasse, não comia na minha mesa", disse o avô das crianças órfãs e feridas. Dá pra imaginar que tipo de criação um biscuit desses deu ao filho.
Semana passada, em Porto Alegre, um pai esfaqueou a filha, de 3 meses, alegando... Nem sei o que ele alegou. Você não tem o que alegar quando esfaqueia um bebê. Legítima defesa? A menina morreu dias depois e os jornais pararam de noticiar a história.
E este fim de semana, as manchetes ficaram por conta do cara de Mato Grosso que contratou pistoleiros pra darem cabo do filho, por causa de um prêmio da mega sena. O pai e um outro filho teriam tramado tudo, pra ficar com os 28 milhões que o rapaz ganhou e que estão depositados na conta do pai. A notícia completa é ainda mais louca: o filho em questão está sendo julgado por homicídio. Durante um bingo beneficente, ele se confundiu ao cantar um número e se ofendeu com os comentários de um sujeito na plateia. Sacou o revólver, começou a atirar, não matou o ofensor, mas acertou um outro coitado na cabeça. Quer dizer, nesse caso pai e filhos quase que se merecem. Ou pelo menos explicam a existência um do outro.
De todo modo, são histórias que me deixam perplexo. A violência por si já é espantosa e inexplicável. Mas quando se volta para alguém do nosso sangue assume proporções de tragédia. Muito antes de ameaçar a frágil economia europeia, os gregos acertavam a mão escrevendo histórias que até hoje nos comovem. Édipo, que matou o pai e dormiu com a mãe. Medeia que, traída pelo companheiro, matou os dois filhos para se vingar. Prometeu, que roubou o fogo dos deuses para dá-lo aos homens. Mitos que continuam se reproduzindo nos noticiários do mundo inteiro, com uma violência cada vez maior e mais injustificável. E agora, sem a grandeza salvadora da poesia.