terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Monstros sem Freud


A culpa deve ser do Tom e Jerry. Ou do Bip Bip e Coiote. Não há outra explicação razoável para a série de atentados terroristas que tem vitimado cães, no que parece ser a última moda em bestialidade moderna. O sujeito pega o cachorro, amarra no carro e sai arrastando o bicho estrada a fora. Outro enterra o cãozinho recém-nascido ainda vivo. Soube de crianças em um condomínio que brincaram de atirar gatinhos recém-paridos contra a parede - um deles sobreviveu com sequelas cerebrais. Não é culpa dos astros, dos pais nem da água? Então, só pode ser coisa de Tom e Jerry: as pessoas deram pra acreditar que o mundo é um desenho animado, você explode uma bomba aqui, atira o outro pela janela ali - e no quadro seguinte, a vida prossegue como se nada houvera.
Há também a série de mães que se livram de filhos indesejados largando-os na rua, em sacos plásticos, lixeiras, rios. Outro dia, uma mãe atirou os bebês gêmeos pela janela. Para estes casos, bem ou mal, a ciência parece encontrar explicações. Depressão pós-parto, miséria extrema, vício em crack, sempre se saca algum freud da cartola. É aterrorizante pensar que se possa abandonar assim um neném tão frágil, indefeso. O terror cresce quando quem faz isso é a mãe, o pai, o gerador daquela vida. Não há nesse comentário nenhum cristianismo, é pura sensação de sobrevivência da espécie. Tenho comigo a ideia fixa de que lutamos para preservar os nossos, como quem se assegure da continuidade da própria semente.
A maldade contra animais ainda escapa à análise. À minha, pelo menos. Ninguém obriga um sujeito a ter um cão. Eu nunca tive, não gosto de cachorro, procuro evitar a menor intimidade, meus amigos sabem disso. Nem por isso, abafo em mim um envenenador de cães, um atropelador de gatos, um estripador de sapos. Eles lá e eu aqui, esse sempre foi meu lema em relação a bichos. O lema agora mudou: "eles lá, eu aqui e as feras que maltratam bichos na cadeia". Não é possível que a pessoa arraste um pitbull amarrado ao carro, até o bicho perder as patas e a vida, e não receba mais que uma multa. (Pensando bem, é possível, sim: atropeladores embriagados depositam a fiança e voltam para casa, com a carteira de motorista no bolso, sem sequer serem obrigados a pagar o tratamento ou o enterro de suas vítimas).
Para as mães que tentam se livrar de seus filhos, parece, resta alguma esperança: de que ela se arrependa e volte chorando; de que seu estado de penúria seja amenizado e ela tenha condições de amar sua prole... É a esperança na justiça, divina, terrena ou satânica. A vingança pelos inocentes sacrificados. Agora, quem sadicamente tortura animais abdica dessa esperança. Para covardes assim, não há cura na linha do horizonte.
Quem enterra um filhote recém-nascido ainda vivo não deve ter muita noção dos limites que a vida estabelece. O homem que liga o carro e arrasta o cão que certamente o adorava está pouco ligando para o que sentem outros seres humanos. Maltratar um cão ou um velho ou uma criança ou uma mulher são apenas dobraduras do mesmo origami sangrento. Em algum ponto de suas vidas, essas criaturas sádicas deixaram de ser corrigidas ou simplesmente notadas. Alguma falha no sistema houve. Ninguém sai do comportamento de anjo de procissão para o rally do cachorro arrastado em dois ou três dias.
Assistimos perplexos a essas aberrações. Lemos no jornal, vemos na TV. Ficamos chocados. Mas não conheço ninguém que seja parente, amigo, vizinho ou sequer conhecido de um desses torturadores que brotam dos noticiários como gremlins ensandecidos. A vida torna-se um reality show do terror. O sujeito inspira-se num monstro e decide cometer uma atrocidade ainda maior. Busca o holofote, o flash. Seu cão escapará. O Tom sempre sobreviveu aos ataques do Jerry. E o Tom era apenas um gato!
Me pego pensando em como reagiria se um vizinho fosse esse personagem monstruoso. O primo de um amigo. O irmão de um colega de trabalho. O pavor ganharia corpo e voz. Por enquanto, ainda, a água não atingiu meu quintal...

2 comentários:

  1. Bem triste mesmo ver o que as pessoas são capazes de fazer com bichinhos inocentes e que não podem nem se defender de tanta maldade. E a gente achando que já tinha coisas ruins o suficiente espalhada pelo mundo,estamos sempre sendo surpreendidos por esses, que nem merecem o titulo de "seres humanos". Só lamento :/

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  2. Nem diga, monstros d evem pagar por atrocidades como estas. Mal consegui ler algumas dessas matérias.

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