Quantos posts dura a sua revolta? Você já se habituou a conter sua indignação nos 140 toques do twitter? As redes sociais estão aí e há mesmo quem diga que a primavera árabe começou graças a meia dúzia de twittadas bem dadas. Tenho minhas dúvidas sobre a eficácia do facebook como agente propagador de revolta - pelo menos, do tipo de revolta que derruba ditadores, destitui o senado e avança rumo à liberdade. Como se fosse um personagem de peça enigmática dos anos 70, me pergunto se "O Sistema" permitiria realmente a ampliação descontrolada de um serviço que pode causar tantos danos aos de cima.
Do ponto de vista de brasileiro habituado a navegar nos mares dos perfis e opiniões definitivas das redes, não tenho motivos para muita euforia. Por aqui, o que mais rolou mesmo foi "Lula, vá se tratar no SUS", "Imprensa burguesa ignora A Privataria Tucana" e "Todo mundo morre (ou todo mundo perde o emprego), menos o Sarney". Sinceramente, estamos a anos-luz de uma primavera árabe.
Houve também a caça aos torturadores de animais, com fotos, dados pessoais e chamadas ao apedrejamento moral em infinitos posts. Os acusados foram condenados antes mesmo de qualquer investigação - e as notícias que as coisas não eram bem daquele jeito são ignoradas nas redes. Se for realmente comprovada sua culpa, os tais torturadores merecem ser punidos e não apenas pagar uma multa. Mas não podemos queimar etapas e dar o veredito antes do julgamento. Se queremos que se aplique justiça, devemos começar a partir de nós mesmos. Entretanto, nem os culpados foram punidos, nem os revoltosos partiram para a ação armada. A indignação coube no facebook.
Também pelo lado bom da coisa, a eficácia das redes sociais é duvidosa. Temos pena de quem sofre, choramos por um menino acuado por bullying na França, achincalhamos o prefeito ou o governador ou o/a presidente por não tentar resolver os problemas sociais que se espalham ao nosso redor. Mas poucos de nós levantam realmente o traseiro do sofá e vão à luta, reúnem roupas que não usam mais, compram cestas básicas, aderem ao transporte público ou tomam alguma outra atitude mais elogiável. Trocamos tudo por um post inteligente, de preferência com muita repercussão entre quem nos curte.
Estamos contaminados pelo bom mocismo. Somos instados a nunca mais pisar num supermercado que use sacolas plásticas, mas nem percebemos que a campanha dita ecológica só servirá mesmo para livrar o quitandeiro de pagar pelo saquinho que continua a ser oferecido ao cliente - a diferença é que o Abílio Diniz quer que você pague pelo tal saquinho.
Da mesma forma, os ciclistas - que a colunista Bárbara Gancia apelidou acertadamente de talebikers - gritam em defensa de vias exclusivas. E todo mundo, mesmo quem não diferencia uma Monark de uma Caloi dobrável, inicia a infinita série de posts bem intencionados sobre a ciclovia e sua importância para a sobrevivência da espécie no planeta. Eu defenderei os bikers com muito gosto a partir do momento em que não correr mais o risco de ser atropelado por um deles. Deve ser um dogma da categoria: ciclista ignora sinal vermelho e avança sobre o pedestre com a impiedade de um tubarão faminto. Isso não é bacana.
As lições de convivência e respeito, tão cantadas nas redes sociais, ainda estão no limite das boas intenções. Depois de escrever meia dúzia de palavras legais sobre um tema edificante, nos sentimos liberados a puxar a brasa pra nossa sardinha, dane-se o resto. Desde que possamos espalhar nossos pensamentos profundos e fundamentais sobre qualquer tema humanitário, adquirimos passe livre pra não nos mexermos e fazer o que realmente é preciso para melhorar o mundo.
Uso e acho muito legais o facebook e o twitter. Mas não atribuo a eles a capacidade de melhorar a sociedade em que vivo. Não somente pelo fato de, ali, desfilar muita gente preconceituosa, carola, egoísta e, acima de tudo, sem a menor intimidade com a língua pátria. Tem muita gente legal também. Gente inteligente, bem humorada, do bem. Mas nem os "malvados" partem pra porrada, nem os "bonzinhos" largam sua nuvem. É tudo muito adolescente, tudo muito "amo" ou "odeio", "morte a isso", "fora com aquilo". A convivência, que é bom - e é o melhor desse jogo chamado vida -, está se diluindo nas nuvens do virtual. Isso é real.
Bem pertinente! Redes devem servir como meios pra conversar de verdade, pra expor e até mesmo mudar suas opiniões, divertir e aproximar as pessoas. Mas a necessidade de unanimidade, do ame ou odeie acaba castrando o bom bate papo. Viva o boteco!
ResponderExcluirMário, eu ia escrever no facebook, semana passada, que por duas vezes quase fui atropelado por ciclistas na região da Paulista, porque eles simplesmente ignoram a sinalização. E ia falar, também, do caso do meu médico, que foi, acredite, atropelado por um skatista e se ferrou inteiro. Parabéns pelo post. Sérgio Roveri
ResponderExcluirTenho a mesma cisma... E temo pela epidemia de burrice aguda de pessoas que se dividem entre dois lados, mesmo oscilando de um extremo ao outro cheios de justificativas calcadas na pobreza de seus conceitos rasos. Já pensou se a gente resolvesse parar de pagar imposto para exigir o retorno em saúde ou educação? Em vez de correr pro Facebook, berrar 'verdades' e exigir dos outros uma atitude. Ai...
ResponderExcluirBeijo,
Rosani