segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Baticum do Repeteco


Eu gosto de carnaval. Por mais adulterado que esteja o sentido original, carnaval ainda é quebra de parâmetros - ou, pelo menos, deveria ser. Gosto da ansiedade que começa na madrugada do dia 1.º de janeiro , o que você vai fazer no carnaval? Em São Paulo, a pergunta sempre tem uma faixa bônus: "vai viajar?". Paulistano sempre viaja no carnaval ou acha que pode viajar... São cinco dias de curtição, marcada por cerveja gelada, orgias de corar calígulas, só sacanagem e folia, ninguém é de ninguém... Ou apenas 4 ou 5 dias de descanso, talvez um cinema, a leitura em dia... É carnaval, oba!

Nesse período, eu quase que só consigo escutar samba. E se for pra brincar de marchinha, ai de quem não tocar as minhas preferidaas: Alá-lá-ô e Touradas em Madri. Sério, você já parou pra analisar a letra de Alá-lá-ô? Aquilo é de um non-sense, de uma irreverência e de uma geleia geral que fariam Samuel Beckett dar novo sentido a Esperando Godot. Em dias de politicamente correto, não há nada melhor que misturar Alá com falta d'água, viemos do Egito com lança-perfume... (e de quebra, ainda emenda com a Cabeleira do Zezé, será que ele é bossa nova, será que ele é maomé...). Touradas em Madri vai na mesma linha do non-sense antropofágico, mistura Catalunha com Ceci e Peri e ainda tempera tudo com uma onomatopéia delicicosa, paratimbum-bum-bum...

Carnaval também é ver mais um desfile deslumbrante criado pelo Paulo Barros (é esse o nome do homem?), desta vez pra Unidos da Tijuca. Acho que, depois do furacão Joãosinho Trinta, Paulo é o primeiro carnavalesco a quebrar paradigmas, avançar fronteiras e perguntar, mãos na cadeira, olhos nos olhos da imensidão: "Por que não?" Carnaval é empurra-empurra, é sacode geral.

Então, me digam, por que diabos me dá sempre uma entediante sensação de dejá vu quando leio as manchetes de jornais e sites durante o carnaval? "Vai Vai, Rosas e Vila Maria são as favoritas" ou algo do gênero - no Rio, é "Beija Flor, Mangueira e..." Dá a impressão que são os mesmos títulos do ano passado e do anterior e do anterior e... A criatividade do carnaval se esgota na avenida e, às vezes, nem chega nela.

Este ano, nosso carnaval recebeu um 'habite-se' de primeira grandeza. Madonna, em pessoa, acompanhada do namorado brasileiro e das filhas, apareceu nos camarotes e até concedeu que as pessoas olhassem para sua figura (nos hotéis, os funcionários são proibidos de olhar para ela, muito menos de lhe dirigir a palavra). Paris Hilton, a milionária, também apareceu por aqui e ainda faturou algum fazendo propaganda de cerveja.
Você não percebeu que o carnaval agora acontece de verdade? Enquanto são apenas os astros e celebridades de sempre, bem, a coisa fica praticamente em família - afinal, a Suzana Vieira já apareceu tanto em nossas vidas que é quase como uma prima desbocada, que bebe todo natal e deixa a Tia Ceição morta de vergonha. Mas desta vez, não! Veio gente de fora!
Madonna, Paris Hilton e aquele abdomen tanqunho do filme 300... ah, as celebridades internacionais estão de volta. Agora, sim, o Brasil entrou na grande rede! Agora não precisamos mais erguer os dedos indicadores e sambar escondidos no escurinho da sala durante o desfile de nossas escolas preferidas. Podemos até assobiar "Mamãe eu quero" no elevador, porque todo mundo viu que a rainha do pop assistiu a um desfile. Um desfile de nossas escolas! Em português! É a glória! Do jeito que saiu na imprensa, foi um pequeno passo para a Madonna, mas um grande passo pros brasileiros.


2 comentários:

  1. Cheguei com o olhar descansado de Ubatuba e achei brega o desfile da Unidos da Tijuca. A Madona é celebridade chata, só gosto dela dançando e cantando, pelo seu cinismo, acho que concordamos. Aquele negócio se sair catando criança africana para adotar então é odioso. Pobres dos pobres, até seus filhos são usados para promover os ricos.
    Na praia li contos de Nelson Rodrigues e agradeci a Deus por ser brasileira e poder conhecer um talento como o dele, genio da liberdade de expressão e ousadia.
    Gosto do carnaval de São Paulo, que por enquanto é menos performático do que o do Rio.

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  2. O Paulo Barros fez um desfile apoiado em truques de teatro (a troca de roupa, o carro que pegava fogo, com luz e papel, etc,) e só por isso já merece o prêmio. Brincou com o visual, foi realmente criativo.
    Madonna canta? Eu nunca gostei daquela vozinha anêmica. Mas reconheço que ela é boa de marketing. Convenceu todo mundo que é irreverente.

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