Thiago Klimeck (à esq.), que morreu como Judas em Itararé |
De vez em quando lembro de uma resposta que o ator-diretor Hugo Possolo deu quando o "acusaram" de ser vaidoso. "Eu sou artista, tenho que ser vaidoso", disse ele. "Só a vaidade explica porque a gente fica em cima do palco". Não sei se era um chiste ou jogo de palavras, mas que eu concordo com o Hugo, concordo. A vaidade impulsiona os atores. Em alguns casos, é o único impulso, porque vaidade e talento não são sinônimos.
Voltei a lembrar da frase do Possolo, ao acompanhar a agonia do jovem ator Thiago Klimeck. Thiago quem? Thiago Klimeck morreu aos 27 anos, depois de se enforcar acidentalmente numa encenação da Paixão de Cristo, no interior de São Paulo. Até o dia 6 de abril, poucos tinham ouvido falar no talento dramático dele. Ontem, Thiago Klimeck foi assunto até do Fantástico.
Como milhares de outros estudantes de teatro e atores já formados, Thiago muito provavelmente era vaidoso e sonhava ser conhecido. Ninguém sobe no palco pra ficar anônimo, ninguém escreve peça ou lança livro pra ser ignorado. A vaidade nos faz querer mais. É humano. É óbvio. Doentio é o que algumas pessoas fazem em nome da vaidade, mas isso já é outro assunto. O tema aqui é Thiago Klimeck.
Infelizmente, para Thiago, a fama veio da forma errada. O Judas Iscariotes que ele fez na praça de Itararé entrou para a história do teatro porque seu intérprete morreu em cena. Morreram o personagem e o ator e até agora as pessoas tentam entender como isso aconteceu.
Nem assim o nome de Thiago Klimeck conseguiu o espaço que merecia. Ele se tornou "o ator que se enforcou encenando a Paixão de Cristo", no genérico. Thiago Klimeck, nome sonoro, bom pra ser anunciado em microfone e em elenco de novela, diluiu-se no noticiário. Virou apenas "o ator". E sobre o rapaz que morava com a família sabe-se pouca coisa. A imprensa de celebridades, que nos informa até a cor da cueca que o fulano usava na lua de mel, deixou pra lá os detalhes do jovem Klimeck - ele morreu, mesmo, de que adiantaria?
Vendo a notícia da morte, percebo que nada soubemos do ator. Será que ele queria fazer novela? Quem sabe, cinema? Talvez tentar uma vaga na trupe de Zé Celso, ser mais um dos atores do Oficina? Pode ser que Thiago sonhasse entrar para o CPT e, talvez, ser um novo Luiz Mello, um novo Lee Thalor... Se as coisas apertassem, ele não se importaria em animar festa infantil fantasiado de Pluto ou Cebolinha... Fazer propaganda ridícula, faturar uns trocados como estátua viva na Paulista, batalhar por um projeto, um patrocínio, uma permuta... Bateria a dúvida da carreira certa? Será que ele desistiria na próxima temporada e começaria a trabalhar na loja de material de construção do tio? Ficaria noivo, casaria, teria filhos e, do teatro, guardaria somente a foto dele como o Judas mais impressionante que Itararé já tinha visto... Bom, essa última parte ele conseguiu...
Ninguém diz se Thiago era bom ator. Dedicado, ele era: passou seis meses ensaiando o truque do enforcamento, uma cena que se repete milhares de vezes em toda encenação da Semana Santa... Será que o Judas que ele representou até o fim merecia mesmo um lugar na história do teatro? Será que as pessoas ficaram com vontade de xingá-lo quando ele veio dar o famoso beijo traiçoeiro em Jesus Cristo? Quem era Thiago Klimeck, além de ser o ator que se enforcou no meio da Paixão?
Ficaremos no vácuo das informações. Talvez no velório alguém lembre que Thiago sempre chorava quando assistia a Paixão de Cristo. Quando tinha a cena do Judas, então... E o ouvinte sacudirá a cabeça, filosófico. "Parece que tava adivinhando..." Uma outra pessoa, também por ali, vai comentar que alguém insistiu pra ele ser Pôncio Pilatos, mas Thiago teimou, queria porque queria ser o Iscariotes. De novo, a filosofia popular: "Parece que tava adivinhando..."
Thiago alcançou a fama em plena transição da vida para a morte. Caso os defensores da vida após a morte estejam errados, ele morreu sem saber de sua notoriedade. Caso estejam certos, ele certamente vai passar um tempinho revoltado, porque, afinal de contas...
Isso é bem triste Mario! Lindo texto, até vejo uma nova peça sua partindo daqui. bjs
ResponderExcluirFlávio
Caro Mário, sou fã de seu trabalho e fiquei contente quando vi que estava trabalhando com o Lauro César no novela Máscaras, contudo, acho que a novela não está boa, é muito loucura junta e muita coisa sem sentido, a médica é pirada, nem parece médica, uma história meio sem sentido. Olha, a diferença de Poder Paralelo é muito grande. Desculpe o atrevimento, mas, só falo porque gosto do trabalho de vocês. Edma
ResponderExcluirMário:
ResponderExcluirFaz tempo q vc não alimenta seu blog e eu tb q não passo por aqui.
Hoje vim te fazer uma visita e dou de cara com este texto sobre o ator Thiago Kilmeck, morto na encenação de Crito!
Emocionante seu texto e concordo com o Flávio: sua veia dramatúrgica está na essência deste post! É bem provável que vc tenha o próprio Thiago ou a circunstância vivida por ele como mote de uma peça! Vou ficar na espera e na torcida! bjs
Maurício
Nossa, parabéns pelo texto/homenagem!
ResponderExcluirAh! Se todos nós atores/atrizes(artistas em geral) tivéssemos esse reconhecimento, como discorre, sem precisarmos de um enforcamento real! Pois, enfim... teu texto me lembrou da pobre/rica Macabéa de "A Hora da Estrela"! A arte imita a vida, e a vida imita a arte!!!