segunda-feira, 16 de maio de 2011

A verdadeira tropa da elite



Saber que uma associação de moradores de Higienópolis manifestou-se contra uma estação do metrô na Avenida Angélica seria algo absolutamente normal numa sociedade democrática. Nesta cidade convivem palmeirenses, corintianos, santistas e até torcedores da Portuguesa. Gays desfilam de mãos dadas pela mesma Paulista em que homofóbicos dão as caras e, muitas vezes, agridem quem está em volta. Mulher de gravata e homem de saia, madame e faxineira, noiado e alérgico a perfume, esta cidade vê de tudo - por que não veria uma associação que se pretende isolada do que chamaram, poeticamente, de gente diferenciada? É outra maneira de nomear pobre-feio-mendigo-nordestino-preto-bicha e todas as ramificações nascidas do cruzamento dessas categorias. Uma bicha preta sergipana, esteticamente bastante prejudicada e sem CEP pra chamar de seu tá ferrada. Nem na calçada pisa.
O que marcou a manifestação dessa entidade - mais pra pomba gira que pra preto véio - foi a pronta aceitação que o governo estadual deu aos queixumes. "Ah, não querem estação ali? Então tá." Como se construir uma complexa malha de transporte público fosse algo tão simples quanto mudar o sofá de lugar na sala. Sobre tudo isso já se falou, houve churrascada na Angélica e o porta-voz da entidade (eh eh zifio) veio a público queixar-se de bullying. É muito bafafá pra pouco tititi.
A primeira coisa que chama a atenção nesse passo em falso do governo é que qualquer projeto apresentado, idealizado, bolado, lançado, rascunhado pelo governo anterior será imediatamente apagado dos anais da história, pouco importa sua importância para camadas expressivas de paulistas. As aulas de inglês reforçadas foram pro beleléu, porque lançadas pela gestão anterior. Com o metrô não seria diferente. No Brasil, estamos habituados a isso, ao arrasa-quarteirão de todo novo governo, botando por terra o que os anteriores fizeram. Inédito no caso é que há 20 anos é o mesmo partido que "governa" São Paulo. Em tese - e esse povo adora uma tese acadêmica - seriam todos irmãos, interessados em permanecer no poder (a regra da alternância só vale para os outros partidos).
Além de se confundir com essa quizumba interna, o usuário do metrô paga o pato também pra deixar de ser besta e ter algum dinheiro. Coisa mais desagradável é essa mania de querer transporte público decente - mesmo que o preço das passagens seja de primeiro mundo. Mancomunado com seu inimigo íntimo - o sempre lembrado e nunca suficientemente lamentado, Jilberto, o Alcaide - o atual governo estadual dá verdadeiras aulas de menosprezo a quem precisa de ônibus e metrô.
Enquanto foi limitado a uma linha entre Santana e Jabaquara, o nosso metrô era motivo de orgulho paulistano. O "nosso" metrô era mais moderno que o de Paris, mais novo que o de Nova York, mais bacana que qualquer outro. Bastou algum demagogo estender um tantinho mais as linhas e danou-se. Um bando de pobre começou a se apertar nos vagões, apresentando espetáculos deprimentes a cada vez que vai ou volta do trabalho. O metrô deixou de ser "nosso" e passou a ser "deles", os diferenciados. Pra que gastar dinheiro com eles? É de admirar que as estações e trens ainda mantenham um grau de limpeza decente...
Não é apenas a polêmica da estação Angélica que me leva a pensar nisso. É o dia a dia. Eu poderia, por exemplo, sair de minha casa e ir até o Sesc Pinheiros de metrô: a estação Trianon-Masp fica a 5 minutos deste computador e a Faria Lima a dois passos do Sesc. Dispensaria o carro, economizaria o estacionamento... mas não dá, porque, embora inaugurada há vários anos, a tal estação continua em fase de teste, fechando às 15 horas. Dei um exemplo até fútil, mas pense em quantos trabalhadores dependeriam desta estação. Quantos outros vão depender da hoje inaugurada estação Pinheiros, pertinho da Faria Lima. O horário continua esdrúxulo. A estação é inaugurada sem banheiro nem outras "mordomias" que esse povo agora deu pra querer, do tipo celular funcionando. E não se sabe quando a situação será regularizada. Quando o paulistano terá um metrô que atenda, ao menos parcialmente, sua necessidade de locomoção?
É tudo ligado. O horror da associação de Higienópolis aos pobres, o descaso do governo estadual ao usuário de um sistema moderno de transporte e até o desdém com que ele, Jilberto, o Alcaide, trata o trânsito da cidade que deveria administrar - para quem não sabe, Jilberto só usa helicóptero para ir de sua casa, nos Jardins, à prefeitura, no centro. Evita engarrafamentos, buracos, contato com pobres... Ele, que deveria ser o primeiro a ver os buracos do asfalto... Não é de admirar que o pessoal não queira metrô na Angélica. O exemplo vem de cima.

5 comentários:

  1. Pena que as pessoas, enrustidas na ignorância sobre si mesmos, não saibam que enxergar diferenças onde elas não existem, ao contrário de expor uma exclusividade, como imaginam em sua ingenuidade, reforçam o medo exacerbado que possuem.
    Quando vão se ligar que ver a igualdade é que lhes trará a liberdade?
    Ai ai, e novamente se evidencia o museu de grandes novidades e o reforço de equívocos tão velhos quanto o mundo.
    Ainda se intitulam sábios e poderosos, essas crianças que têm medo de seus monstros imaginários.
    Um brinde de cicuta à ignorância!

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  2. Se a cicuta for pra gente, que seja veloz. Se for pra eles, que seja lenta. muito lenta...

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  3. Kkkkkkkk a cicuta é só pra essa ignorância de "diferenciada"! Como apontou em seu texto, e de forma muito gostosa de ler, essas imensas segregações reforçadas a todo instante.

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  4. Mário:
    Comentei muito no Face sobre o absurdo dos elitistas de Higienópolis que não desejam estação de metrô na Av. Angélica. Além dos descalabros já levantados por vc, queria ressaltar que num momento em que a cidade não suporta mais os engarrafamentos e a poluição (sabe-se lá qtos automóveis circulam ou tentam circular pelas ruas), há alguns levantando-se contra transporte coletivo!
    É o fim mesmo. E o alcaide por onde anda? De helicóptero formulando plataforma (não de metrô) mas de NOVO PARTIDO. A única coisa q sabe fazer nos últimos meses. A cidade abandonada, mas isso não é "calçada" do prefeito. Viva-se com tanto desrespeito ao cidadão-eleitor!!!!
    bjs
    Maurício

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  5. Pois é, Maurício... Estamos jogados às traças por este ser criado em laboratório... Mas a "zelite" não tá nem aí. Se tiver lugar pra guardar o carrão, tá beleza.

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