
E eis que, de repente, um senhor de 80 anos sai pelo mundo e até estreia em cinema defendendo uma legislação mais moderna para o consumo de maconha. FHC - por quem nunca morri de amores, mas a quem eu dei meu primeiro voto, nos finais da década de 70 - é o principal nome do documentário brasileiro "Quebrando o Tabu", dirigido por Fernando Grostein Andrade, irmão do Luciano Hulk e, portanto, cunhado de Angélica. Todos no mesmo táxi.
Não me senti muito animado a ver o filme, mas fiquei pensando que esse Fernando Henrique é danado de esperto. Já faz algum tempo, o bom velhinho tem manifestado em entrevistas a saudade que tem do tempo em que fazia oposição e, pelo teor das mensagens, julga-se sério candidato a porta-voz dos contrários. Também acho que falta uma oposição que preste no Brasil. Até uns dias atrás, imprensa e classe média estavam em clima de lua de mel com Dilma Rousseff. É bom lembrar que até ser eleita, ela era apenas "aquela mulher", "eu não voto naquela mulher", etc. Virou Dilma, mostrou-se discreta, agradou os mais conservadores. Escorregou com a história do enriquecimento do Palocci e estatelou-se com a estrada desnecessária em cena do ex-presidente Lula. Agora, todo mundo é oposição - mas não do jeito que FHC imagina, ou seja, em torno dele. É uma oposição tão fisiológica quanto a situação de uma semana atrás.
O que me espantou na esperteza FHCiana é que ele agora tenta ocupar a vaga abandonada por todos os políticos, com a provável exceção do Fernando Gabeira: o de defensor de alguma coisa menos careta. Ainda soam nos ouvidos a gritaria em torno do aborto, que desviou as atenções da campanha eleitoral. Ou os brados retumbantes contra a lei anti-homofobia que ecoam na Câmara dos Deputados. Ao retrocesso mental e ideológico explicitado por Dilma, Serra, Jilberto, o Alcaide, e outros oportunistas interessados no voto dos evangélicos, FHC entrega-se ao papel de vovô bacana, aquele que entende perfeitamente quando o netinho aparece enrolando um beck no quintal de casa.
De todos os políticos, é justamente o imperial FHC quem acena para os jovens com uma flamulazinha menos conservadora. É claro que até agora ninguém perguntou por que ele não fez alguma coisa nesse sentido durante os 8 anos de seu governo. Ou por que o governador de São Paulo, também do PSDB, optou em descer o sarrafo nos manifestantes da Marcha da Maconha, recentemente. Seja como for, FHC - a quem continuo dando o mesmo valor de antes - entra dando cutucadas em Dilma, Serra (um antitabagista de babar na gravata), Alckmin e Jilberto, o Alcaide. E ainda sobra umas espetadas em José Sarney, vencedor inconteste da calhordice ao declarar que o impeachment de um presidente foi um acidente na história do Senado brasileiro. Não deixa de ser coerente: alguém que pensa assim só pode mesmo praticar a política que conhecemos.