segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Dor nas costas


Quando a cabeça doi, toma-se uma aspirina. Quando é o dente, procura-se o dentista. Mas, quando são as costas que doem, toda a esperança que você poderia ter num mundo melhor e ensolarado se esvai. A dor nas costas tira a gente do eixo e nos obriga, impiedosa, a considerar a passagem inexorável do tempo como uma maldição. Pode reparar: ouvido, cabeça, estômago, dente e panturrilha, quando doem, é chato. Costas, quando doem, indicam envelhecimento galopante.

Pior ainda, a dor nas costas nos força a achar um culpado. Se não é uma outra pessoa, é a sua própria consciência que pergunta: "Que movimento brusco você fez pra causar isso? " Costas nunca doem do nada. E mesmo sem querer, lá está você olhando o vazio e repisando todos os movimentos nos últimos quatro dias. O diacho é que sempre se acha um possível culpado.

A dor nas costas deve ser o incômodo mais judaico-cristão que nosso corpo produz. Se bem que aqueles árabes espetados em camelos também devem sentir um abalo na coluna considerável e eles não são nada católicos. E aquele povo que cata tomates? Bons de alongamento eles são... mas ai, doi só de olhar.

A sacanagem é se dedicar a exercícios, ginásticas, suadouros, tudo em nome da boa forma e de manter um corpo num estado minimamente apresentável à sociedade - e tudo isso ruir com um simples movimento. Às vezes, feito até na academia! Isso deveria dar procon. Pra ser justo, acho que se não fosse tanto exercício e hidroginástica, a crise seria pior. Desta vez, foi até fraca. Mas chata, porque lembra que esse corpinho tem muitos limites.

Pra distrair a cabeça, fui ver "Você vai conhecer o homem dos seus sonhos", o mais recente Woody Allen, considerado fraquinho por muita gente. Eu mesmo não achei tudo isso - mas gostei bastante. Assisti na boa, gostei de muita coisa, especialmente dos finais abertos pras histórias. Gostei de ver Woody remexendo nos temas de sempre, o que me ajudou a pensar no meu próprio trabalho e no medo de me repetir. Ok, entre Woody Allen e Mário Viana tem uma distância abissal, mas a Camila Possolo vai ajudar a reduzir isso.
A arte serve para nos levar a outros mundos, a nos tirar desse mundinho de dores vulgares e também para nos estimular. Foi isso. Saí do cinema com menos dor e mais animado. Woody Allen é o analgésico ideal.

8 comentários:

  1. Impressionante como a dor nos faz pensar. Mas, cá entre nós, é muito bom envelhecer. Imagine se não tivéssemos esta sorte... Ou como diria Woody Allen em "Descontruindo Harry": Ir ao médico é um sofrimento. Ele pode dizer: é maligno. hehehe

    ResponderExcluir
  2. Ana V., como diz o Arnaldo Antunes, a coisa mais moderna que existe nesta vida é envelhecer. Saudades. Bjs

    ResponderExcluir
  3. Tempo tempo tempo tempo / Entro num acordo contigo... =)

    ResponderExcluir
  4. O problema é que o corpo não obedece acordos. É tipo um pmdb, saca?

    ResponderExcluir
  5. Mário, acabei de escrever sobre o filme do Woody Allen. Se bater curiosidade, dá uma olhada: http://whiskycomleminski.zip.net/

    ResponderExcluir
  6. Mário:
    como sempre, seu texto é hiperbemhumorado e divertido!
    A arte nos ajuda inclusive com as dores, mesmo se for a das costas!
    E imagine o quanto suas peças já serviram de analgésicos para o público: "quem ri, seus males espanta"!
    Bjs Dr.
    Maurício

    ResponderExcluir
  7. Essas dores são periódicas. Começaram nas nossas primeiras preguiças em consertar a postura e se manifestam nos exercícios, peladas de futebol e basquete, e quando carregamos televisões, mudamos um móvel de lugar. Viu, a busca dos culpados.
    Allen, mesmo fraquinho, é muito bom. Revisita os mesmos temas, mas sempre diferentes, com olhares, digamos, contemporâneos!

    ResponderExcluir